CARTAS DE YOKOHAMA: A HISTÓRIA DO TÍTULO MUNDIAL CORINTIANO NARRADA POR PAULO ANDRÉ
Do susto ao ver o Chelsea passear contra o Monterrey à
emoção sentida na palestra do técnico Tite. Os dias que antecederam a maior
conquista da história do Corinthians narrados por Paulo André.
QUINTA-FEIRA, 13/12, 18h
QUINTA-FEIRA, 13/12, 18h
Chegamos ao
hotel Sheraton, em Yokohama,
e fomos direto a um espaço exclusivo, instalado no 4° andar, onde fizemos, a
partir de então, todas as nossas refeições. A comida, que era preparada magistralmente
pelo chef Jaime - cozinheiro oficial da CBF que nos acompanhou nessa viagem -
já estava pronta e a Cris, nossa nutricionista, supervisionava todos os
detalhes da mesa e fornecia comprimidos com suplementação específica para cada
jogador.
Eu estava
cansado porque não havia conseguido dormir bem na noite anterior, em Nagoia,
depois do difícil segundo tempo contra os egípcios do Al-Ahly. Apesar do corpo
destruído pelo cansaço, a cabeça estava a mil tentando achar soluções para os
nossos problemas.
Durante o jantar, fomos informados de que a saída para assistir ao
jogo entre Chelsea e Monterrey era às 19h, e o grupo de atletas que queria ir
ao estádio era enorme. Seria uma forma de reconhecer o local, sair um pouco do
hotel e ver os adversários com os próprios olhos. Tudo isso poderia ajudar em
nossa preparação, mas, durante o jantar, o Martínez e
o Guerrero,
que dividiam a mesa comigo, me convenceram a ficar no hotel. Disseram que
poderíamos conversar durante o jogo, tranquilos e sem passar frio. Eu estava
curioso para ver o Chelsea, mas o cansaço de nossa partida contra o Al-Ahly e a
viagem de trem que havíamos acabado de fazer pesaram. Resolvi ficar e, ao
entrar no meu quarto e esticar o corpo em cima da cama, percebi que tinha feito
a escolha certa. Olhei para o relógio, já eram 19h30 e eu nem tinha me mexido
ainda. Estava no meu quarto, sozinho, e resolvi ficar por ali mesmo.
Já
nos primeiros minutos ficaram evidentes o domínio e a facilidade com que os
ingleses comandavam a partida. Perdi o sono e comecei a prestar mais atenção na
maneira como faziam aquilo. Para falar a verdade, comecei a ficar preocupado
com o que estava por vir. Pela TV, parecia que eles estavam um nível acima do
nosso, algo mais poderoso do que havíamos enfrentado até então. Não conseguia
entender por que os jogadores do Monterrey não agrediam a marcação, não eram
agudos quando roubavam a bola, e, pior, perdiam todas as divididas. Quando
levavam a bola para um dos lados do campo, não conseguiam trocar quatro passes
sem que o Chelsea a roubasse novamente. O time inglês era compacto, forte e
veloz, e a impressão que eu tive foi a de que eles nem precisaram pisar fundo
no acelerador para vencer a partida.
Assim
que acabou o jogo, às 21h30 do horário local, eu capotei. Acordei às 7h30 do
dia seguinte, curiosamente a minha melhor noite de sono desde a chegada ao
Japão.
SEXTA-FEIRA, 14/12, 8h
Desci para o café e fui averiguar como foram as impressões de quem
havia acompanhado o jogo in loco. 'Estádio grande'; 'o campo é um pouco maior
que o anterior'; 'não estava tão frio'; 'um jogo bom'. Senti algo estranho no
ar. As informações eram superficiais, ninguém falou que o time dos caras era
bom ou que o jogo seria difícil. Parecia que ninguém queria assumir os
sentimentos que aquele passeio dado pelo Chelsea resultou em nossa mente.
Só
quando o Felipe, zagueiro e meu companheiro de quarto, acordou é que pude
arrancar
as reais impressões e reações daqueles que foram ao jogo. Em
resumo, ele disse que ficou
surpreso
e assustado com a qualidade do nosso adversário na final. Exatamente como eu,
pensei. Ninguém assumiu o medo e a insegurança gerados a partir dali, mas, no
semblante, todos demonstravam preocupação.
No final da manhã, fui ao quarto do Bruno Mazzioti, fisioterapeuta, para o tratamento de manutenção dos meus joelhos. A 'sala de fisioterapia' era um quarto normal no 11° andar. Naquele espaço havia duas camas, vários aparelhos e instrumentos de atendimento. Estirados sobre as camas estavam Douglas, com uma dor no adutor, e Fábio Santos, reclamando do músculo posterior da coxa. Sem opções, puxei uma cadeira, estiquei a perna por cima da cama e comecei a receber tratamento no tendão. De repente, o Fábio me olha e solta: 'Nós vamos ganhar, Paulo?'.
Aquela pergunta trouxe à tona tudo o que eu havia visto e sentido pela TV. Eu tinha ficado impressionado com a qualidade do Chelsea e sabia que não era o único a ter tido aquelas impressões, mas estava numa posição delicada, perigosa. O que eu dissesse poderia mudar a cabeça de dois jogadores muito importantes na nossa equipe. Eu não podia ser indiferente, não podia dizer que sim ou que não. Precisava compartilhar o que eu estava sentindo e minha resposta deveria ser suficientemente verdadeira para convencer aqueles dois companheiros de que a luta valeria a pena na batalha que estava por vir. E então saiu: 'Só ganharemos se tivermos coragem, Fábio. Coragem para assumir riscos, fazer passes quando a vontade é dar chutão e afastar o perigo. Não podemos deixá-los com a bola nos pés o tempo todo. Temos que cutucá-los com força, chegar à frente e, sem dúvida, pressioná-los no campo deles quando a vontade for ficar esperando, para não errar e abrir espaço. Se fizermos isso, formos pra cima, teremos grandes chances'.
No final da manhã, fui ao quarto do Bruno Mazzioti, fisioterapeuta, para o tratamento de manutenção dos meus joelhos. A 'sala de fisioterapia' era um quarto normal no 11° andar. Naquele espaço havia duas camas, vários aparelhos e instrumentos de atendimento. Estirados sobre as camas estavam Douglas, com uma dor no adutor, e Fábio Santos, reclamando do músculo posterior da coxa. Sem opções, puxei uma cadeira, estiquei a perna por cima da cama e comecei a receber tratamento no tendão. De repente, o Fábio me olha e solta: 'Nós vamos ganhar, Paulo?'.
Aquela pergunta trouxe à tona tudo o que eu havia visto e sentido pela TV. Eu tinha ficado impressionado com a qualidade do Chelsea e sabia que não era o único a ter tido aquelas impressões, mas estava numa posição delicada, perigosa. O que eu dissesse poderia mudar a cabeça de dois jogadores muito importantes na nossa equipe. Eu não podia ser indiferente, não podia dizer que sim ou que não. Precisava compartilhar o que eu estava sentindo e minha resposta deveria ser suficientemente verdadeira para convencer aqueles dois companheiros de que a luta valeria a pena na batalha que estava por vir. E então saiu: 'Só ganharemos se tivermos coragem, Fábio. Coragem para assumir riscos, fazer passes quando a vontade é dar chutão e afastar o perigo. Não podemos deixá-los com a bola nos pés o tempo todo. Temos que cutucá-los com força, chegar à frente e, sem dúvida, pressioná-los no campo deles quando a vontade for ficar esperando, para não errar e abrir espaço. Se fizermos isso, formos pra cima, teremos grandes chances'.
'Então
acho que vamos ganhar', rebateu Fábio. Meio que sem querer, a conversa mudou de
rumo e seguiu num tom ameno e divertido, sem o peso que estávamos carregando
nos ombros. O Fábio relembrou a história do Edenílson, que em Nagoia, dias atrás, havia
sido questionado pelo Guilherme Torres, que olhava atônito pela janela do
quarto: 'É neve, Edenílson?'. 'Não, não, são pernilongos
albinos'.
Na
hora do almoço, fui informado de que daria, ao lado do Guerrero, a entrevista coletiva. Apesar de
estar acostumado com as entrevistas, daquela vez foi diferente. Havia dezenas
de câmeras e jornalistas do mundo inteiro. O ambiente estava uma loucura e eu
sabia que minhas palavras poderiam repercutir no mundo todo. Comecei falando de
nossa vontade de vencer, dei algumas impressões sobre jogadores da equipe
inglesa e como trabalharíamos isso na final.
'Como parar o Chelsea?', alguém perguntou. Não sei por que, mas
veio à minha cabeça o jogo contra o Santos pela semifinal da Libertadores,
quando conseguimos parar o Neymar. Segui essa linha de raciocínio porque era o
que precisava ser feito para termos alguma chance na final. Só que para colocar
a teoria em prática teríamos uma distância muito grande a percorrer.
No
final da tarde, saímos para treinar. O clima continuava tenso. Fomos para uma
sala, ao lado do campo, que foi usada como vestiário para que passássemos
ataduras, pomadas e fizéssemos um aquecimento prévio. Antes, paramos para um
cafezinho, enquanto a caixa de som do Sheik tentava dar um ar descontraído ao
ambiente, que tinha Paulinho e Julio Cesar colocando apelidos nos
mais novos, Romarinho e Guerrero atirando qualquer coisa que
voasse na cabeça dos que estivessem por perto, e a velha guarda, Chicão, Alessandro e Danilo, esticando as juntas e iniciando o
alongamento.
Surpreendendo a todos, Tite entrou e pediu
para alinharmos as cadeiras em círculo, de forma que ele pudesse falar. Aquela
seria a primeira vez que ele faria um discurso desde o jogo contra o Al-Ahly,
havia dois dias. Ele começou dizendo que entendia como era difícil ter toda a
responsabilidade do mundo sobre os ombros. Não analisou friamente o primeiro
jogo, mas se colocou na nossa pele e entendeu o que nos fez recuar e permanecer
acuados enquanto o time egípcio trocava passes em frente à nossa defesa. Em vez
de 'dar uma dura', ele estava do nosso lado, mostrando-se compreensivo e,
principalmente, um leitor perfeito dos nossos sentimentos naquele jogo. Então
ele se aproximou de nós, repetindo que também sentiu pressão, demonstrando que
ele também é humano, passível do peso da responsabilidade, o que nos fez muito
bem.
De
repente, ele parou. Aumentou a respiração, chegou a ficar ofegante. Mudou as
feições. Sua pele começou a enrubescer. Lentamente, ele olhou no olho da cada
um. Girou o corpo até dar a volta completa e gritou: 'Vocês vão olhar no olho
dos caras, vocês vão dentro deles'. Seus olhos começaram a marejar. Naquele momento,
a emoção tomou conta da sala, e a vontade era de que o jogo começasse ali.
Estávamos prontos para a guerra. Eu não sei como, mas as dúvidas se
transformaram em certezas, o frio na barriga se transformou em coragem e uma
sensação de conforto me invadiu. Ele dizia, no gauchês: 'Nós vamos a morrer,
até o fim. Não vamos parar, não vamos desistir. Eu quero e trabalhei a vida
inteira para chegar aqui, alcançar o meu sonho, disputar essa final. Nós não
vamos fazer como o outro time. Nós não vamos demorar 50 minutos para dar uma
chegada em alguém. Eu não quero saber quem está do outro lado, eu quero
competição, com lealdade, mas vamos dentro dos caras. Só precisamos repetir
tudo aquilo que nos trouxe até aqui. Da mesma forma. Não vamos mudar nada,
vamos jogar muito e vamos merecer vencer. Ao trabalho', disse, apontando para o
campo e terminando sua palestra.
SÁBADO, 15/12, 12h
Durante o almoço, o Fabio Carille, auxiliar do Tite,
passou de mesa em mesa procurando os seis jogadores que compunham o sistema
defensivo. Alessandro, Chicão, eu, Fabio Santos, Ralf e Paulinho fomos convidados para uma reunião
que aconteceria dali 15 minutos.
Nosso encontro foi, mais uma vez, no quarto da fisioterapia. Como
quadro-negro em forma de campo e uma caneta esferográfica na mão, Tite começou: 'Eu quero
informar vocês que já conversei com o Douglas e
quem vai jogar no lugar dele será o Jorge
Henrique. Nós precisamos de mais velocidade nas beiradas, precisamos
acelerar tanto a transição defensiva para ofensiva como a transição
ofensiva/defensiva. O Jorge vai fazer a função que fez contra o Santos, na
semifinal da Libertadores. (Nessa hora, pensei: Foi tudo o que falei para a
imprensa ontem. Sem querer, entreguei o ouro para o bandido. Será que o Tite está bravo
comigo?) Ele vai bloquear o lado esquerdo do adversário, auxiliando o Alessandro na
marcação do Hazard e do Ashley Cole'. E prosseguiu: 'Se eles vierem com
Ramires, Mikel, Hazard, Mata, Oscar e Torres, acontecerá o seguinte: nossas
duas válvulas de escape serão Paulinho e Fábio
Santos. Por quê? Porque o Mata não fica enfiado na ponta direita, ou seja,
teremos que fazer a bola chegar rápido naquele setor para conseguirmos
triangular e sair. Se fecharem aquele espaço, o Paulinho vem
buscar a bola entre os zagueiros e vai conduzi-la. Pode se mandar, Paulo, eles
não vão te acompanhar. Caso contrário, Paulo
André e Chicão têm
a opção do fundo, com Sheik e Jorge
Henrique'.
E foi
assim, sentados na cama do quarto, que definimos a tática que seria usada na
grande final. Naquela noite, apesar da ansiedade, recebemos um brasileiro,
amigo do Felipe, que mora há muito tempo no Japão e vende produtos eletrônicos
desbloqueados. Ele foi ao nosso andar no hotel e o corredor virou um espaço
para negócios. Jogadores, integrantes da comissão, rouparia e cozinha testavam
aparelhos, faziam contas e compravam iPhones, iPads e máquinas fotográficas de
todos os tipos.
Fui
para o quarto. Estava sem sono e resolvi arrumar a mala. Minha logística era
mais complicada, porque eu mandaria algumas coisas de volta para o Brasil pelos
companheiros e a outra parte seguiria comigo nas férias, nos Estados Unidos.
Enquanto organizava as coisas, percebi que minhas mãos tremiam, não tinham
firmeza para manusear as roupas. Não era o frio, mas sim ansiedade e tensão às
vésperas do momento mais importante da minha vida. Quando percebi aquilo,
sorri. A maturidade me permitiu perceber e aproveitar cada segundo daquela
caminhada rumo ao dia D. Senti-me realizado por viver um momento como esse,
mesmo que repleto de inseguranças e incertezas, porque estava confiante de que
essa preocupação exacerbada não me deixaria falhar. Eu estaria atento demais
para cometer um erro bobo, afinal, batalhei por 15 anos da minha vida sonhando
disputar uma final como essa.
As
mãos foram se aquietando e fui relembrando toda a trajetória desse time. As
agruras do Campeonato Brasileiro de 2011, com seus momentos trágicos e mágicos;
a construção do título da Libertadores, do qual não pude participar; e, agora,
um Mundial que estava tão perto e
tão longe ao mesmo tempo. O bendito fuso horário finalmente serviu para alguma
coisa. Quase que imediatamente após deitar, capotei.
DOMINGO, 16/12, DIA DA FINAL, 11h40
Descemos para a última reunião do ano. Como de praxe, o primeiro
slide da apresentação já estava disponível no telão: 'Se você está percorrendo
o caminho dos seus sonhos, comprometa-se com ele. Assuma o seu caminho de
vitória. Enfrente-o com CORAGEM'. Em voz alta, o Tite leu
essas palavras e iniciou seu discurso de motivação.
Logo em seguida, passou três ou quatro vídeos curtos com os
princípios de jogo e as estratégias que ele jamais nos deixa esquecer - em sua
maioria, são nossos próprios exemplos de atitude e estratégia retirados de
jogos importantes que fizemos durante todo o ano. Ele sempre bate na tecla de
que foram esses esforços que nos conduziram por caminhos de sucesso nos últimos
dois anos. Já vimos centenas de vezes os mais de 30 exemplos que ele nos dá, e
ele sabe como ninguém evidenciar aquilo que é mais importante e que precisa ser
enfatizado.
Em
seguida, assistimos aos curtos vídeos sobre o Chelsea, onde vimos pontos fortes
e fracos. Novamente, pensei comigo mesmo, uma ação cirúrgica da comissão
técnica, que conseguiu produzir um material encorajador, por conta da
quantidade de falhas que encontramos na equipe inglesa. Nos pontos fracos vimos
uma equipe com grande dificuldade na transição defensiva quando sua primeira
linha de marcação era ultrapassada. Pelo menos era o que mostrava a maioria dos
gols sofridos por eles na Liga dos Campeões e no Campeonato Inglês.
Inconscientemente,
ganhamos confiança, sentimos que eles eram de carne e osso. Tite não
terminava a palestra e repetia coisas que já havia dito, não para reiterar, mas
para espantar seu próprio nervosismo e certificar-se de que havia nos passado
tudo. 'Frio na barriga', confessou, quando percebeu o que estava acontecendo.
Por
fim, ele nos entregou uma matéria que saíra no site da Fifa naquela manhã,
falando sobre a multiplicação do time em campo, a disposição e a solidariedade
com que aquela equipe jogava desde a Copa Libertadores. A tarde foi sem fim. A
hora não passava. O sono não aparecia e o frio na barriga aumentava.
DOMINGO, 16/12,SAÍDA PARA O ESTÁDIO, 17h
Finalmente, estávamos todos sentados e posicionados no ônibus que
nos levaria ao estádio. Tite chamou o Alessandro, que saiu do penúltimo banco à
esquerda e foi ao encontro do treinador. Conversaram baixinho. Alguns segundos
depois, desceram as TVs do ônibus e um vídeo começou a ser transmitido. Era
mais uma produção da comissão, com a participação de nossos familiares. Cada um
dos 23 jogadores estava sendo representado por alguém - mãe, pai, filhos, irmã
ou irmão. Até a mãe do Guerrero e o pai do Martínez haviam sido gravados pelo
Skype.
Tudo muito emocionante, até que um dos pais começou a chorar,
dizendo que o filho merecia estar ali, que era um exemplo e que voltaria
campeão do mundo. Ninguém se moveu, todos evitaram olhar para o lado. Não era
hora de chorar! A garganta segurou o choro, os olhos se encheram de lágrimas, a
vontade de representar nossos familiares aumentou. O corpo todo estava
arrepiado quando o vídeo acabou. Uma salva de palmas trouxe a normalidade ao
ambiente enquanto uns olhavam de um lado para o outro para ver o tamanho do
'estrago' feito por aquela surpresa. Ficou claro que o Tite queria saber a
opinião do nosso capitão Alessandro com
relação à apresentação, ou não, do vídeo. Emocionar demais os atletas seria bom
ou ruim? Foi na medida certa, estávamos prontos para o jogo.
Ao
chegarmos ao vestiário, cada um encontrou seu material e a camisa de jogo
pendurada no cabide. Eu sentei no meu box, respirei fundo e percebi que não
tinha mais para onde correr. Na minha frente estava a maca na qual os
enfermeiros e fisioterapeutas trabalhavam em ritmo acelerado. Uma fila se
formou naquele lugar. Cássio foi o primeiro, depois o Chicão, Alessandro e Guerrero. Quatro injeções em menos de três
minutos. Lembrei-me das inúmeras injeções que tomei nos últimos anos, a maioria
delas para conseguir passar aqueles 90 minutos sem dor. Não precisei disso
desta vez, mas estava atento e solidário porque sabia exatamente o tamanho do
sofrimento e da dificuldade de cada um deles.
Mas uma coisa me chamou a atenção: Cássio saiu de uma maca e foi para outra para que o Bruno Mazziotti mobilizasse seu ombro. Algo que já o vinha incomodando há meses e que, às vezes, ele dizia impedi-lo de levantar o próprio braço. Como eu me lembro de tudo isso? Ainda faltavam 30 minutos para o aquecimento e eu não tinha o que fazer ali dentro. Peguei meu celular e comecei a escrever tudo que estava acontecendo. Foi algo especial que me fez observar o Cássio naquela noite. Sua expressão de dor era nítida, mas tinha um olhar profundo, como quem estava concentrado, visualizando o que estava por vir - se bem que, talvez, nem em seus melhores sonhos ele imaginasse que iria apresentar tamanha perfeição muito em breve.
Mas uma coisa me chamou a atenção: Cássio saiu de uma maca e foi para outra para que o Bruno Mazziotti mobilizasse seu ombro. Algo que já o vinha incomodando há meses e que, às vezes, ele dizia impedi-lo de levantar o próprio braço. Como eu me lembro de tudo isso? Ainda faltavam 30 minutos para o aquecimento e eu não tinha o que fazer ali dentro. Peguei meu celular e comecei a escrever tudo que estava acontecendo. Foi algo especial que me fez observar o Cássio naquela noite. Sua expressão de dor era nítida, mas tinha um olhar profundo, como quem estava concentrado, visualizando o que estava por vir - se bem que, talvez, nem em seus melhores sonhos ele imaginasse que iria apresentar tamanha perfeição muito em breve.
No corredor, aguardando o comissário da Fifa que autoriza a
entrada das duas equipes no campo, perfilamos ao lado do time inglês. O
Ivanovic, um defensor alto e muito forte, começou a bater no peito como se
estivesse pronto para a briga. Confesso não ter me impressionado, mas gostei da
tentativa. Ao subir a escadaria que nos levou até o campo, senti uma alegria
indescritível. O som do estádio aumentou, e a nossa torcida fez uma verdadeira
festa, dominando a cena no Yokohama Sttadium.
O juiz deu
início à partida e, dali para frente, eu pouco consigo lembrar. As imagens
devem falar muito mais do que eu poderia escrever. De qualquer forma, quando
saímos para o intervalo e caminhamos até o vestiário, o encorajamento e a
confiança tinham tomado conta do grupo. Sentamos no chão à espera do Tite, que, antes de passar
as instruções, tem o costume de se reunir com três ou quatro membros da
comissão para definir o que será passado, em termos de mudança, a nós,
jogadores.
Enquanto
ele não aparecia, individualmente alguns jogadores tomaram a palavra. Alessandro disse que estava ótimo e,
se continuássemos assim, ganharíamos. Paulinho repetiu, cobrando ainda mais
intensidade. Eu pedi calma, pois teríamos mais espaços para jogar e, se
mantivéssemos a marcação, teríamos a bola do jogo nas nossas mãos. E assim foi,
de boca em boca, que a confiança explodiu em nossos corações. Após o jogo, eu
cheguei à conclusão de que, enquanto chegávamos ao vestiário pensando:
'Caramba, dá pra ganhar', o Chelsea foi para o intervalo pensando: 'Caramba, dá
pra perder'.
E o que se viu no segundo tempo foi exatamente isso. O gol
do Guerrero veio
coroar um segundo tempo magistral que fizemos. Fábio
Santos e Danilo tabelavam
pela esquerda como se estivessem na rua de casa. Paulinho se
soltou mais e encontrou um buraco no meio-campo inglês. Jorge
Henrique estava extenuado e, mesmo assim, não desistiu de nenhum
lance. Nós, da defesa, mantivemos a coragem e seguramos a linha de quatro o
mais alto possível. Enquanto Alessandro barrava
o melhor jogador da equipe londrina, Cássio fazia
seus milagres no estádio de Yokohama. Emerson
Sheik aproveitou sua malandragem para expulsar o zagueiro adversário, e
o Ralf corria
três vezes mais que qualquer um de nós. Depois, Wallace entrou
para segurar a bola aérea e o guerreiro Paolo deu lugar para Martínez.
Quando
o juiz decretou o fim do jogo, só consegui dizer: 'Campeão do Mundo, Campeão do
Mundo, Campeão do Mundo!' A cabeça percorreu o estádio, pensou em cada
corintiano que atravessou os continentes e estava ali testemunhando aquela
noite inesquecível. Procurei meu pai e meu irmão por duas voltas olímpicas, mas
não os encontrei. Só abraçaria os dois loucos lá de casa no dia seguinte, no
café da manhã. Dei algumas entrevistas. O sorriso não saía do rosto.
Voltamos ao
hotel. Tomamos champanhe, cerveja, refrigerante e comemos, pela primeira vez em
15 dias no Japão, a verdadeira comida japonesa, com sushi e sashimi à vontade.
Depois da celebração com toda a comissão e funcionários, subimos aos quartos
para arrumar as malas. Fábio
Santos,Douglas,
Sheik, William
Arão, Bruno Mazzioti, Edu Gaspar (gerente de futebol), Cleber (auxiliar do Tite), Duílio Monteiro Alves
(diretor-adjunto de futebol), Roberto Andrade (diretor de futebol) e eu
sentamos no chão do corredor do hotel e, como bons amigos de uma jornada
incrível, começamos a conversar sobre toda a nossa caminhada até ali. Outros
jogadores foram se aconchegando e o papo não teve fim. Ficamos até às 6h da
manhã dividindo histórias e rindo da vida. Lembranças, amigos e sentimentos que
jamais deixarão o meu coração e a minha mente. Somos campeões do mundo! Mas
esse mesmo coração já começa a vislumbrar 2013 e quer voltar a bater acelerado
com novas conquistas e grandes histórias. Quem sabe não voltarei aqui para
contá-las?
Essa é a minha versão dos fatos, com as palavras, horários e dados
que ficaram em minha memória. Direto do aeroporto de Los Angeles, onde aguardo
minha conexão para as merecidas férias, Paulo
André.
Fontes: ESPN e Paulo André (página oficial)
Fontes: ESPN e Paulo André (página oficial)
Comentários