Pular para o conteúdo principal

São Pedro e São Paulo: missionários de Jesus Cristo


“Combati o bom combate, completei a corrida, guardei a fé” (2 Tm 4, 7).

Solenidade de São Pedro e São Paulo é uma oportunidade para se refletir a respeito de três questões importantes para a vida e missão da Igreja: a missão, o missionário e o exercício da autoridade. São realidades interligadas e que falam do Cristianismo, ou seja, este não pode ser compreendido sem a missão, sem o missionário que a realiza e sem o exercício da autoridade servidora.

A missão

A missão é de Jesus Cristo. Assim, tanto o cristão quanto a Igreja são chamados a participar da missão de Jesus Cristo. Esta verdade desautoriza qualquer pessoa a se apoderar da missão. Todo missionário é um discípulo de Cristo e continuador de sua missão no mundo.

A missão está em função do Reino de Deus. Isto significa que a missão não está em função da construção ou expansão de nenhuma denominação religiosa. Utilizar-se da missão para expandir a Igreja é um pecado e, conseqüentemente, um equívoco grave. Neste sentido, a própria Igreja já se reconheceu como um instrumento a serviço do Reino de Deus. 

Na Igreja, todo batizado é um missionário. Toda pessoa batizada participa do múnus missionário de Jesus, ou seja, pelo batismo a pessoa aceitou seguir e anunciar Cristo ao mundo. Para isto, ela não precisa pedir autorização a ninguém para realizar este anúncio porque o batismo a integra ao mandato missionário de Jesus. 

Ide e evangelizai: eis o mandato missionário. Ir pressupõe sair, caminhar, deslocar-se. A Boa Notícia só chega às pessoas se há outras que a anunciem. Tanto a mensagem (Boa Notícia) quanto o mensageiro (missionário) são movimentos. O Cristianismo é a religião do caminho e da mesa. É impossível ser missionário sem êxodo (saída, caminhada). 

O missionário

O missionário de Jesus é uma pessoa pobre. A pessoa rica, materialmente falando, não tem condições para viver a experiência do êxodo. Esta experiência é uma constante na vida do missionário, ou seja, não se trata de sair por um momento e depois retornar às comodidades da vida material; trata-se de uma saída definitiva, de um deixar tudo. 

Deixar tudo para seguir e anunciar. Os pobres podem ser missionários porque eles se ocupam com pouca coisa. Quando Jesus chamou os doze para estar com ele e pregar o Evangelho do Reino, a resposta foi imediata: deixaram tudo e o seguiram. Este tudo é quase nada, materialmente falando; de modo que quem não tem quase nada é mais livre para a missão. 

Deixar tudo para ser livre. A mensagem evangélica compreende vida e liberdade plenas para todos. Para que esta mensagem possa ser anunciada, o mensageiro precisa estar livre para anunciá-la a partir do testemunho da própria liberdade. Ninguém acredita numa mensagem de vida e liberdade anunciada por uma pessoa alienada e, portanto, escrava e morta. O missionário não é um morto ambulante! 

Humildade, simplicidade e verdade: qualidades essenciais do missionário. Geralmente, as pessoas que escutam o missionário costumam prestar bastante atenção ao comportamento do mesmo no exercício da missão. Sem a prática das virtudes da humildade e da simplicidade, o missionário pode até ser escutado e aplaudido, mas a mensagem anunciada não chega aos corações dos ouvintes. Se não há humildade e simplicidade, não há verdade. 

A verdadeira autoridade

Evangelicamente, a palavra autoridade não soa bem. Ao longo da história da humanidade, as experiências de autoridade foram demasiadamente negativas. O autoritarismo sempre esteve presente na relação entre autoridades e não-autoridades. As primeiras sempre foram consideradas superioras, as segundas subalternas. Eis o ditado popular que legitima esta relação desonesta e, portanto, injusta: “Manda quem pode, obedece quem tem juízo!” 

Jesus não anulou o valor da autoridade, mas lhe conferiu um novo sentido. Na verdade, Jesus inverteu a relação, ou seja, aquele que quiser ser o maior deve ser o servidor de todos. Nesta ótica, a verdadeira autoridade é aquela que se torna servidora. Esta nova orientação oriunda do Mestre (aquele que ensina com autoridade) deve ter deixado os discípulos desconcertados. 

Lavando os pés dos discípulos, Jesus ensinou como deve ser a verdadeira autoridade. Lavar os pés significa estar disponível e preocupado com o bem estar do outro; significa, ainda, viver em função da felicidade do próximo. O contrário disso é o egoísmo. A pessoa egoísta não consegue exercer a verdadeira autoridade porque só pensa em si mesma. Autoridade egoísta só sabe praticar o autoritarismo porque ver no outro a possibilidade de ser servida. 

A autêntica autoridade corresponde a um jeito de ser. Há pessoas que são autoridades como que por vocação. Elas têm em si mesmas aptidões para a coordenação de grupos, comunidades, instituições e tarefas. Para serem de fato, basta que sejam persuadidas e constituídas. Estas pessoas são carismáticas, pois possuem o carisma do poder-serviço. Há, porém, outras que parecem “não terem nascido para a coisa”, pois, por mais que se insista não conseguem ser nem exercer o ofício da autoridade. 

Pedro, Paulo, o Papa e a Igreja 

Seguramente, tudo o que foi dito acima corresponde à vida e à missão dos apóstolos Pedro e Paulo. Apesar das limitações, estes foram verdadeiros discípulos missionários de Cristo: Pedro, coordenador do grupo apostólico (não me arrisco em afirmar que foi o primeiro Papa!) e Paulo, o missionário dos gentios. 

Nesta Solenidade costuma-se fazer referência ao que passou a se chamar ministério petrinoou ministério pontifício. Trata-se do ministério exercido pelo Pontífice da Igreja, o Papa Bento XVI. Numa linguagem mais acessível podemos afirmar que o Papa é o Coordenador Geral do Colégio Apostólico, composto pelos Bispos do mundo inteiro, e responsável maior pela unidade cristã. 

Mais do que a sucessão apostólica, o que legitima o Papa como sucessor de São Pedro é o esforço em ser um homem humilde, simples e verdadeiro. Além disso, o Papa precisa ser pobre, o que é difícil acontecer, levando-se em consideração o estilo de vida que o mesmo leva no Vaticano. Infelizmente, este estilo de vida decorre da dupla função pontifícia que o Papa exerce. Em outras palavras, ele exerce o poder espiritual (Pontífice) e temporal (Chefe de Estado). Isto impede que o mesmo seja, de fato, aquilo que se propõe ser: o servo dos servos de Deus. Na história recente da Igreja, um dos poucos Papas que conseguiu superar as contradições do ofício pontifício foi o “Papa bom”, o Bem-aventurado João XXIII.

A mesma coisa pode-se referir à Igreja, que é chamada a ser uma humilde serva da humanidade, a superar suas contradições internas para se tornar, verdadeiramente, o instrumento eficaz na construção do Reino de Deus. A Igreja não pode se esquecer de sua missão essencial: Evangelizar. E, a fim de que esta missão seja realizada é necessário que a evangelização passe pelo testemunho. Neste sentido, vale a pena reconhecermos o que disse Paulo VI: “O homem contemporâneo escuta com melhor boa vontade as testemunhas do que os mestres – dizíamos ainda recentemente a um grupo de leigos – ou então se escuta os mestres , é porque eles são testemunhas” (Evangelii Nuntiandi, n. 41). 

Autor: Tiago de França. Fonte: "Com Jesus na contramão"

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Peixe, símbolo cristão

O símbolo mais reconhecido do cristianismo é sem dúvida a cruz , que pode apresentar uma grande variedade de formas de acordo com a denominação: crucifixo para os católicos, a cruz de oito braços para os ortodoxos e uma simples cruz latina para os protestantes evangélicos. Outro símbolo cristão, que remonta aos começos da religião. é o Ichthys ou peixe estilizado:  Uma outra versão contendo o acrônimo ΙΧΘΥΣ. Ictus, Icthus ou Ichthus (do grego antigo ἰχθύς, em maiúsculas ΙΧΘΥΣ ou ΙΧΘΥC, significando "peixe") é o símbolo ou marca do cristão. Significado "ΙΧΘΥΣ": trata-se de um acrônimo, utilizado pelos cristãos primitivos, da expressão "Iesus Christos Theou Uios Soter" (em grego, conforme se vê acima), que significa " Jesus Cristo, Filho de Deus, Salvador ". Foi um dos primeiros símbolos cristãos, juntamente com o crucifixo e continua a ser usado. A figura tinha, ademais, um significado místico, porque, como os peixes, também os cristãos eram

"EU VI ELE". Certo ou errado?

EU VI ELE SIM, E DAÍ? Marcos Bagno, coluna FALAR BRASILEIRO da revista CAROS AMIGOS , junho 2010 O pronome “ele” é usado como objeto direto (“vi ele”) no português há mais de mil anos: basta ler os textos medievais. Em dado momento da história de sua língua, os portugueses abandonaram esse uso (nenhuma surpresa, já que as línguas mudam sem parar). Ele, porém, continuou vivo e atuante no português brasileiro e africano. No entanto, só porque os portugueses não dizem “vi ele”, esse uso sempre foi tido como “errado”, como se o “certo” fosse sempre apenas o que os 10 milhões de lusitanos falam, em detrimento dos outros 200 milhões de falantes da língua mundo afora! Pois bem, na gramática de Perini, sem nenhum rodeio, encontramos o seguinte: “Alguns pronomes só têm uma forma, que vale para todas as funções. É o caso de ele, ela e seus plurais, que não variam formalmente quando em funções diferentes: Eu chamei ele para ajudar na cozinha; Ela passou no exame da OAB; De repente eu vi eles c

Grito dos Excluídos 2013 convoca jovens ao protagonismo social

O tema do Grito dos Excluídos de 2013 foi definido, e esse ano a Juventude está no centro dessa manifestação que acontece em 7 de setembro. “Juventude que ousa lutar, constrói o projeto popular” é o lema do 19º Grito dos Excluídos definido pela a coordenação do Grito que acolheu sugestões de vários grupos, comunidades, dioceses, movimentos, sindicatos, para a escolha. O Grito dos Excluídos é uma manifestação popular carregada de simbolismo, é um espaço de animação e profecia, sempre aberto e plural de pessoas, grupos, entidades, igrejas e movimentos sociais comprometidos com as causas dos excluídos. É realizado em um conjunto de manifestações realizadas no Dia da Pátria, 7 de setembro, tentando chamar à atenção da sociedade para as condições de crescente exclusão social na sociedade brasileira. O Grito dos Excluídos, como indica a própria expressão, constitui-se numa mobilização com três sentidos: Denunciar o modelo político e econômico que, ao mesmo tempo, conce