O editorial do jornalão O Estado de S.Paulo cobrando eficiência nos serviços públicos e maior empenho/qualificação de seus servidores é risível pelo desconhecimento ou ignorância proposital das condições concretas sob as quais funcionam tais serviços e pela tentativa onipresente, por parte de certa mídia da qual o jornal faz parte e de certos setores da sociedade, de jogar a população e os trabalhadores da iniciativa privada contra os trabalhadores públicos. Não se poderia esperar nada diferente disso dessa empresa jornalística...
Os critérios normais de eficiência aplicáveis às instituições privadas nem sempre podem ser aplicados aos serviços públicos, por diversas razões:
- Caráter público e não mercantil dos serviços prestados;
- Todos os atos da Administração Pública devem estar SEMPRE vinculadas à lei. Ao mesmo tempo que a vinculação à lei é uma garantia de que haverá o respeito aos princípios que devem orientar a ação do Estado (prevalência do interesse público, publicidade obrigatória da maior parte de seus atos, legalidade, impessoalidade, universalidade em alguns casos, etc.), é uma garantia de todos nós, cidadãos, pois qualquer ato do Estado somente terá validade se respaldado em lei. Representa um limite para a atuação do Estado, visando à proteção do administrado em relação ao abuso de poder.
- Possibilidade de o servidor público perder o cargo por insuficiência de desempenho.
- Obrigatoriedade de treinamento periódico e outros requisitos para ascensão dentro das carreiras e para ocupação de funções comissionadas.
- Concessão de adicionais de qualificação para aqueles que comprovem participação em ações de treinamento e qualificação do interesse do órgão no qual estão lotados.
- Previsão CONSTITUCIONAL (NÃO É AUMENTO) de REVISÃO ANUAL DAS REMUNERAÇÕES dos servidores públicos (art. 37, X da CF), para impedir a perda de poder de compra pela inflação, nos mesmos moldes em que é garantida também pelo texto constitucional a todo trabalhador. No entanto, o mandamento que obriga o administrador público a reajustar as remunerações de seus servidores é descumprido reiteradamente, obrigando os servidores a entrarem em greve.
- Gratuidade integral ou modicidade (preços insignificantes e/ou condições mais favoráveis) da quase totalidade dos serviços oferecidos e de boa parte dos atos praticados pelos órgãos federais, excetuadas as taxas especiais para alguns serviços específicos.
- Especificidade única de certos serviços, não comparáveis aos da iniciativa privada.
- Impossibilidade de atribuir a mentalidade e os critérios do lucro/produtividade/eficiência da iniciativa privada aos serviços públicos, dado o seu caráter social.
- Existência de metas e medidas de eficiência próprias, não apenas quantitativas, mas também qualitativas.
Se dá ou não para envolver os trabalhadores públicos nas decisões políticas de cada órgão/poder é outra questão mais intrincada: como isso poderia ser feito? Para que serviria o mandato, nessa hipótese? Político = mero gestor, síndico?
Há mazelas e desmotivação? Sim, em alguns casos até há, muitas vezes pela falta de valorização devido a vários fatores, inclusive ao fato de que o 'patrão' muda de cara e de postura de tempos em tempos, pelo fato de que os que se erigem em arautos da sociedade vivem de fustigar o serviço público ao invés de exigir sua valorização total, pelo fato de que ainda se pode arrochar os servidores - apesar da CF/88 dizer que não... Mas assim mesmo há muitos servidores satisfeitos e motivados e muitos possuem qualificação bem acima da requerida pelo cargo e vários se preparam, por conta própria, para exercer papéis sociais mais prestigiados ou de maior responsabilidade.
Tudo pode melhorar bastante, inclusive nossa mídia, que é uma concessão pública! A lei da transparência deveria valer pra o Bonner, Merval, Faustão, Leitão, Catanhede, Waack, Mitre, Casoy - todos deveriam publicar seus salários também, já que a imprensa é uma atividade concedida e um serviço de interesse público. Seus métodos de trabalho devem ser objeto de discussão e controle social, também - por que não? É concessão de serviço público.
Autor: Flávio Prieto. Coautor: Denilson Lopes
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