Milhões de cristãos do mundo inteiro celebram a festa da Páscoa do Senhor, a festa de Jesus Cristo Ressuscitado. Mas que consequências práticas terão para a humanidade e mesmo para a vida das pessoas o fato de crer que Jesus ressuscitou e nos comunica a sua vida nova? Para a irmã Dorothy Stang, dar a vida pela preservação da Amazônia e por seus pobres indefesos. Para Dom Oscar Romero, arcebispo de São Salvador, significou aceitar o risco da morte, procurando ser fiel na defesa da vida dos pobres, como Jesus fez. Até que ponto se pode apresentar tal perspectiva como boa notícia?
Celebrar a Páscoa é teimar na convicção de que, pela energia da ressurreição de Jesus, o amor semeado no coração humano é capaz de fazer brotar um mundo novo, uma Igreja mais humana e aberta à humanidade, assim como nós mesmos recebemos a força de renascer interiormente. Os profetas da Bíblia tinham prometido que Deus daria a ressurreição a todo o povo. Libertaria Israel da escravidão e o poria de pé em meio às nações (Cf. Ez 37). A ressurreição supõe insurreição. Quem crê na ressurreição não se conforma em ser escravo ou viver dependente. A Páscoa é profecia do universo transfigurado. Há quase dois mil anos, as comunidades cristãs praticam essa teimosia e expressam isso mais fortemente, cada vez que celebram a festa da Páscoa. O próprio termo hebraico “Páscoa” significa “salto, dança, ou passagem”, uma espécie de carnaval da teimosia e da esperança. No norte do mundo, é primavera e as plantas renascem. No sertão do nordeste, é a “volta da asa branca”, que o sofredor da seca sempre espera. Luiz Gonzaga cantava: “quando o verde dos teus olhos se espalhar na plantação...”. Um antigo cântico litúrgico reza: “O Cristo ressuscitou, o sertão se abriu em flor, da pedra, água surgiu. Era noite, o sol raiou, aleluia!”.
Celebrar a Páscoa não vai mudar mecanicamente a situação social, política, ou econômica do mundo. Não eliminará doenças físicas ou dores do coração. A Páscoa não é uma coisa que ocorre por milagre, magicamente. É profecia, grito de liberdade e vitória para dar força a quem continua na luta. Hoje, a medicina reconhece o riso como método terapêutico. As pessoas descobrem que resiliência significa a capacidade de sair mais forte de algo que poderia nos ter destruído. Dizia alguém: “O que não me mata, fortalece”. Esta verdade é sinalizada nos símbolos do Evangelho. Jesus ressuscitado revela-se com o corpo ferido e chagas nas mãos, nos pés e no peito, mas vivo. Seus discípulos se alegram em vê-lo e lembram sua palavra: “Filhinhos, no mundo, sempre tereis aflições. Coragem: eu venci o mundo” (Jo 16, 33).
No mundo atual, os poderes da morte continuam agindo. O desamor organiza uma sociedade cruel e sem compaixão, escrava do dinheiro e do poder. Mas no coração de muita gente, teimosamente, ressoam os gritos de Páscoa. No meio das mais áridas paisagens, resistem as flores. Mesmo a mais asquerosa lagarta é chamada a uma mudança radical. Rompe o casulo, ganha asas para voar e transforma-se em uma linda borboleta. É símbolo da vocação do ser humano para esse caminho pascal.
Quem celebra a Páscoa sabe que democracia não pode ser dada por presidentes e poderosos. É conquista da sociedade civil organizada. Vale a pena descobrir que a paz, a solidariedade e a própria transformação do mundo, em grande parte, depende de cada pessoa que se dispõe a participar dessa festa da ressurreição que é a movimentação civil por um mundo novo possível.
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