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Festas juninas e o futuro do mundo

Há quem olhe uma festa popular como mera alienação das difíceis lutas do dia a dia. De fato, no tempo do antigo império romano, cada vez que alguma guerra se aproximava ou uma lei iria tornar mais difícil a vida de todos, a ordem era misturar o pacote de maldades com o que os pensadores do império chamavam de "pão e circo”. Essa fórmula vigora até hoje em certos círculos do sistema opressor. Até hoje, jornais televisivos sem compromisso com a realidade crítica alternam notícias de massacres e crimes com cenas de futebol. Depois de mostrar imagens da seca e fome no nordeste, filma na mesma região algum forró de São João. Por falar em São João, nesses dias, os festejos juninos já tomam conta do Brasil. Eles têm origens pré-cristãs nas mudanças de estação. Na cordilheira peruana, os índios festejam o ano novo andino.

No Brasil, o catolicismo popular promoveu os festejos de Santo Antônio, São João e São Pedro com brincadeiras caipiras, quadrilhas e comidas típicas de cada região. Algumas das danças juninas vieram das cortes da Europa e são hoje o que se chamam "quadrilhas” que ainda usam termos franceses e fazem as pessoas se vestir de caipiras e dançar como a nobreza de outros séculos. Nos casamentos matutos, figuras como padres e juízes da roça são caricaturadas porque só se interessam por dinheiro e poder. Independentemente se tais críticas são justas ou exageradas, elas revelam o modo como as camadas mais empobrecidas do povo podem expressar sua crítica e seu protesto social. Mesmo o fato de considerar Santo Antônio um santo casamenteiro, associar São João Batista com fogueira e brincar com as chaves de São Pedro quebra algo da seriedade sisuda com que se costumam olhar os assuntos do céu e parece que ligam os santos às realidades de cada dia.

Nesse momento, o mundo capitalista está mergulhado em uma crise estrutural. Em vários países da Europa, grupos radicais ameaçam tornar mais rígidas as regras internacionais de migração. Alguns setores religiosos afundam em um fundamentalismo fanático. Conferências da ONU como a Rio 92+20 parecem fadadas ao insucesso. Do outro lado, mesmo que não pareçam, as festas juninas revelam que nosso povo tem uma surpreendente capacidade de se organizar (quando deseja e se o assunto é do seu mundo afetivo).

Em um mundo sem perspectivas, esse caráter lúdico da crítica popular, latente nas brincadeiras juninas, pode ser um ensaio não apenas de uma dança de quadrilha ou de uma encenação caipira. Elas ensaiam uma sociedade nova na qual todos são protagonistas. Assim, na alegria e de forma despretensiosa, grupos e comunidades populares sinalizam uma realidade nova que se aproxima ao que os evangelhos chamam de reinado de Deus. Do seu modo e em sua linguagem lúdica, parecem traduzir uma palavra que os evangelhos atribuem a São João Batista: "Mudem de vida porque a realização do projeto de Deus no mundo está próximo!” (Mt 3, 2).

Marcelo Barros
Monge beneditino e escritor
Há vinte anos, em junho de 1993, celebrou-se no Rio de Janeiro a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, também conhecida como Cúpula da Terra. Os resultados foram a aprovação do Programa 21, um plano de ação mundial para promover o desenvolvimento sustentável, e a Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento – basicamente, um conjunto de princípios que definem direitos e obrigações dos Estados em relação à natureza e ao desenvolvimento.

A Cúpula teve dois grandes protagonistas. De um lado, George Bush pai, presidente dos Estados Unidos, que anunciou no Rio que “o estilo de vida norte-americano não está aberto a negociações”. De outro, o comandante da revolução cubana, Fidel Castro, cuja posição pode ser resumida na seguinte frase, extraída de seu discurso ao plenário da reunião: “Se se quer salvar a humanidade desta autodestruição, é preciso distribuir melhor as riquezas e tecnologias disponíveis no planeta. Menos luxo e menos desperdício em poucos países, para que haja menos pobreza e menos fome em grande parte do planeta. Não mais transferências, ao terceiro mundo, de estilos de vida e hábitos de consumo que arruínam o meio ambiente. Façamos mais racional a vida humana. Construamos uma ordem econômica internacional justa. Utilizemos toda a ciência necessária para um desenvolvimento sustentado, sem contaminação. Paguemos a dívida ecológica, e não a dívida externa. Que desapareça a fome – não o homem”.

Vinte anos depois daquela Cúpula da Terra, em meio a uma crise estrutural do modelo civilizatório ocidental, as palavras de Fidel ainda ressoam entre os corredores do Riocentro, o luxuoso centro de convenções da Barra da Tijuca, onde se celebrará a Cúpula das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, Rio+20.


Katu Arkonada, que está no Rio de Janeiro, integra o grupo de negociadores do Estado Plurinacional da Bolívia na Rio+20.

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