Carrocracia
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"Um novo brasão para uma velha cidade. No lugar do forte braço empunhando a bandeira da cruz de Cristo, a figura simbólica do soberano que há décadas tem sob suas rodas uma cidade rendida, ofendida, poluída, esgarçada, suja, segregada, barulhenta, burra e, mais que tudo, congestionada. No lugar dos orgulhosos ramos de café, a pistola de combustível que alimenta os senhores das ruas e a impiedosa motoserra, sempre pronta para tirar a vida de qualquer coisa que atrapalhe o pleno domínio do tirano poluidor. No lugar dos frutos do cafeeiro muitos cifrões, para que ninguém esqueça o que move as autoridades e os 'especialistas' a serviço da carrocracia. Por fim, substituindo a coroa de torres há o que restou das antigas, belas e cada vez mais escassas árvores paulistanas, mutiladas e assassinadas à luz do dia ou na calada da noite, maltratadas pelos próprios órgãos públicos a despeito de serem um patrimônio coletivo de valor inestimável. Igual ao antigo brasão apenas o orgulhoso e ufanista lema de outrora, hoje ainda mais atual que ontem: 'Não sou conduzido, conduzo', divisa perfeita para uma cidade que orienta suas políticas e ações em benefício dos interesses dos automóveis e em detrimento da sustentabilidade socioambiental da qual todos dependem. As árvores sobreviventes da Marginal Tietê começaram a desaparecer. Os lacaios da carrocracia estão sorrindo. A história não os absolverá."
Ampliação da Marginal Tietê, restrição a caminhões na Pinheiros e na avenida Bandeirantes que começa hoje, veto a motos nas faixas expressas, confinamento de skatistas, pouco investimento em ciclovias, redução dos impostos para carros...
Todas as esferas do poder público parecem privilegiar quem tem – ou quer ter – um automóvel. Reflexo disso é o índice de motorização na cidade. Em 1991, havia 3,76 carros a cada dez paulistanos. Hoje, a relação é de 6,1.
“Vivemos em uma ‘carrocracia’, pois as ações sempre buscam priorizar aqueles que andam de carro”, diz André Pasqualini, diretor do instituto CicloBR. Aumentar a fluidez do carro na cidade – ao contrário de repensar o lugar dele na sociedade – é, para especialistas consultados pelo “MTV na Rua”, o foco do poder público atualmente.
Enquanto a cidade abre mais vias para eles, um movimento contra a hegemonia do carro ganha força em São Paulo. Para o especialista em trânsito Horácio Augusto Figueira, “os paulistanos estão, aos poucos, percebendo que assim não dá para continuar”. A reflexão sobre o espaço que os automóveis ocupam na vida das pessoas é cada vez mais comum. A psicóloga especialista em trânsito Raquel Almqvist faz uso de uma comparação entre o veículo e o cigarro para apontar o apego do paulistano pelo motor: “O carro é uma necessidade, mas o estresse causado pelo vício no automóvel pode até matar”. As soluções defendidas por especialistas já são conhecidas, como o aumento da qualidade e da quantidade de transporte público e a mudança no estilo de vida. Só falta um detalhe: saírem do papel.
Para o engenheiro de tráfego Sergio Ejzenberg, os paulistanos motorizados são vítimas da falta de opção. “Se tivéssemos uma rede eficiente de transporte público, grande parte dos veículos poderia ficar nas garagens”, analisa. Procurado pelo “MTV na Rua”, o secretário municipal dos Transportes, Marcelo Cardinale Branco, não respondeu às perguntas enviadas pela reportagem.
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